Thursday, March 15, 2007

O Elefante do Circo

Quando eu era menino, todos os anos pelo Natal, acampava um circo na minha cidade, que enchia de sonho e de luz o coração das crianças.
Lembro-me de que o meu avô me levava lá muitas vezes pela mão, mesmo fora das horas de actuação, porque eu adorava ver os animais que eles tinham para os espectáculos. Eram os leões, os macacos e um elefante.
O que me prendia mais a atenção era precisamente o elefante, animal enorme comparado comigo criança ainda. Eu olhava para ele e ficava a pensar se um dia não fugiria dali para ganhar a liberdade, farto, como eu achava que ele devia estar, de ter permanecido preso por tanto tempo. Eu gostava muito de liberdade e pensava que os animais eram iguais nós, com os mesmos gostos e os mesmos sonhos. Afinal ele estava preso apenas por uma pequena corrente a uma frágil estaca que não deveria ser obstáculo difícil de transpor para quem devia ter tanta força.
Durante muitos dias andei a pensar naquilo, até que me atrevi a perguntar aos miúdos mais velhos do que eu sobre os motivos pelos quais o elefante não fugia. Eles respondiam-me as coisas mais diversas, desde «não faço ideia e quem se importa com isso?», até disparates tais como «ele achava que estava bem assim e por isso não fugia»
Como nada disto me satisfazia comecei a perguntar aos adultos e também nenhum deles me soube responder.
Os anos passavam e o elefante voltava sempre com o circo. Entretanto eu já andava na escola. Numas férias do Natal fui dar uma volta sozinho pelas vizinhanças do circo e o elefante lá estava sempre preso a uma fina estaca de madeira. “Como é que ele tão grande, com tanta força, não se libertava? Só podia ser porque não queria libertar-se ou nem sequer pensava nisso. Mas porquê? A liberdade não será tão importante para os elefantes quanto o é para nós?»
As férias tinham acabado e com elas o circo foi-se embora. Foi quando me lembrei de fazer a pergunta ao meu professor, pessoa que eu achava que sabia tudo.
O professor ouviu a minha pergunta com muita atenção e pediu-me uns dias para pensar.
Disse-me que a pergunta era inteligente, que envolvia ideias importantes e que não queria responder-me precipitadamente sem ter a certeza do que dizia. Passaram-se alguns dias até que, no fim duma aula, o professor me chamou para falar comigo sobre o problema do elefante do circo e disse:
“Sabes! Tenho andado a pensar na tua questão e não encontro para ela outra resposta que não seja esta: certamente o elefante foi criado de pequenino no circo e desde o início amarrado a uma estaca pequena, mas que, para o tamanho dele na altura, era suficiente para o segurar. Provavelmente tentou muitas vezes adquirir a liberdade puxando com todas as suas forças pela corrente que o prendia, mas como era pequeno não tinha capacidade bastante para arrancar a estaca. Ao fim de algumas tentativas acabou por desistir de ideia de se libertar e habituou-se a estar preso. Agora é adulto mas já não tenta libertar-se porque continua com a sensação de que não vai conseguir. E assim os donos sabendo isso não se preocupam em prendê-lo a uma estaca mais forte, porque sabem que ele não fugirá.»
Esta explicação, embora não a tenha entendido completamente naquela idade, pareceu-me ser a única que devia de estar correcta. Muitos anos mais tarde, quando percebi que aquela história do elefante preso se aplicava aos homens, é que me dei conta do alcance das palavras do meu professor.


Este conto, aqui reproduzido em palavras minhas, embora preservando a ideia básica original, é uma adaptação livre de um texto lido em «Déjame que te Cuente» da autoria do Psicoterapeuta e Escritor Argentino Jorge Bucay.

6 Comments:

At 8:46 pm, March 15, 2007 , Blogger tb said...

Sim, conheço o texto que acabaste de livremente redescrever. Que grande verdade ele encerra...
Liberdade que nos é sonegada logo que somos crianças até que deixemos de pensar nela.
Parabéns por esta reflexão tão acertiva de nós, embora utilizando uma ideia já expressa, gostei muito!
Beijinhos

 
At 12:50 pm, March 16, 2007 , Blogger Isa e Luis said...

Olá,
Durante a leitura do texto que nos transmite claramente as imagens, transcrevo o que há dias li

Educar os nossos filhos consiste em sabermos preservar a Vida.

Muitos beijinhos para ti

Isa

 
At 4:02 pm, March 24, 2007 , Blogger Moura ao Luar said...

É verdade depois de muitas tentativas frustradas muitas vezes desistimos sem sequer ver as novas oportunidades que se nos apresentam

 
At 7:37 pm, March 25, 2007 , Anonymous Anonymous said...

talvez o elefante estivesse destruído e nada mais importasse. de certeza k foi isso, não achas tb?

 
At 5:43 pm, April 02, 2007 , Anonymous Anonymous said...

Memórias de infância...
A vida por vezes é dura, e n nos deixa viver...

www.rochasuave.blogs.sapo.pt

 
At 9:18 am, May 08, 2007 , Blogger tb said...

Vim procurar novos alimentos...deixo um beijo :)

 

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